quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Sirva-se

Na idade que tenho já era de se esperar que eu servisse para mais coisas. Tenho andado no meu limite ouvindo que não sirvo. Me dizem que eu deveria ser mais prendada. Me dizem que eu deveria sorrir mais, ser mais agradável, falar mais baixo. Me dizem que não sirvo para casar, não sirvo para ser esposa, não sirvo para seguir muito do que me condicionaram a seguir.

Não sirvo mesmo. Não nasci para servir. Se me obrigam a ser doce, calma e a engolir, eu só tenho a dizer que nasci livre. Tenho minha raiva, minha preguiça e não engulo: eu cuspo. Nasci ser humano. Nasci dona de mim e sirvo a apenas uma pessoa: eu mesma. Os poucos pratos que preparo são os que eu gosto de comer. As coisas que digo tem o objetivo de me refletir, de me representar. Ai de mim dizer algo que eu não queira em favor de terceiros! Sou barulhenta, sou espaçosa, sou desleixada e não me importo. Estou servindo a minha vontade, estou respeitando o meu bem estar.

Vejo ao meu redor garotas - futuras mulheres - abaixando a cabeça para servir. Servir aos namorados, aos padrões, à sociedade. Abaixam a cabeça e, portanto, são incapazes de olhar para a frente, ignorando o vasto campo de possibilidades à sua frente. Assim, elas servem. Servem para casar, servem para serem dominadas, servem aos padrões, à opressão, a tudo, menos a si mesmas. Ah, se elas soubessem como é não servir! Não ter obrigação para com ninguém! Quem dera elas soubessem o que é gritar quando precisar explodir, sentir preguiça um dia ou outro, sentir dor como qualquer ser humano, mas também sentir liberdade, ter espaço para simplesmente ser. Sinto que preciso gritar, pular na sua frente e fazer um escândalo para que tirem seus olhos do chão e olhem para frente, olhem para si mesmas. Mas, assim, estou sendo espalhafatosa. Mulheres espalhafatosas não servem. Quem quer uma mulher que grita, que fala alto, que não tem modos, que fala o que pensa? Quem quer uma mulher que não se importa em agradar?

Eu agrado, sim. Agrado a mim. Minha ironia, minha irreverência, minha essência são o que me tornam diferente. Em meio à tantas mulheres de cabeça baixa, eu ando de cabeça erguida, passando por cima de quem tentar abaixa-la. Sei que não estou sozinha. Lá fora existe uma legião de mulheres livres, que sabem o sabor de simplesmente ser.


Deixem-nos ser. Deixem que façamos nossa própria essência. Vivemos enjauladas pela expectativa de virarmos Barbies perfeitas, mas jamais o seremos. Somos falhas, somos humanas, somos de carne e osso. Deixem-nos ser humanas e servirmos a quem realmente precisamos: nós mesmas.


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